quinta-feira, 6 de março de 2014

Capítulo 15 - Dublê de nazista

O problema dos pais ficou resolvido da forma costumeira: Chumbinho
comunicou que dormiria na casa de Calú para receber algumas explicações
sobre a matéria que cairia na "prova" do dia seguinte e iria para o colégio com o
amigo. Os cinco Karas sabiam como manter seu incrível disfarce: os pais de
todos eles estavam convencidos de que seus filhos jamais se metiam em
confusões.
O agente de óculos escuros acabou concordando com a maluquice daqueles
garotos. Concordando? Bem, na verdade, o plano foi impingido a ele como um
purgante. Sua vaidade fora provocada do modo certo e, agora, o plano de Miguel
e de Crânio era para ele uma questão de honra.
Os dois garotos quase não descansaram naquela noite, preparando-se para os
papéis que desempenhariam na manhã seguinte. Chumbinho estava
excitadíssimo, e Calú orientou-o como pôde na arte de representar. Era alta
madrugada quando Calú adormeceu, pensando que o amigo daria um Max
Godson mais ou menos.
"Tomara que os nazistas não desconfiem..."
Depois de uma noite de sono, ou melhor, depois de ficar acordado rolando na
cama a noite inteira, Andrade parecia um grande bebê ranzinza:
— Já estou cheio de fazer tudo o que vocês dizem, seus danadinhos! —
desabafou Andrade na manhã seguinte, quando todos se reuniram na sala da
Polícia Federal, no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, perto de São Paulo.
— Eu devia estar maluco quando concordei com a maluquice do plano de
vocês!
O enorme jato procedente da África do Sul pousou no horário previsto, só que
no aeroporto de Viracopos, em Campinas, e não no de Cumbica. Seguindo as
orientações recebidas pelo rádio, o comandante da aeronave não comunicou a
mudança de destino aos passageiros. Garantiram-lhe que tudo ficaria esclarecido
e que a situação estava sob controle. Assim, os passageiros daquele voo
desceram normalmente e dirigiram-se para o local onde apresentariam os
passaportes.
Ao mesmo tempo, no aeroporto de Cumbica, os alto-falantes anunciaram o
pouso do voo procedente da África do Sul, para que nenhuma suspeita fosse
despertada nas pessoas que pudessem estar à espera de algum passageiro. Como
é normal que passageiros do exterior percam bastante tempo na alfândega antes
de sair para o saguão, Calú e Chumbinho tinham tempo para fazer o que tinha de
ser feito.
Em Viracopos, os funcionários da alfândega deram um jeito de fazer com
que os passaportes e as bagagens de dois jovens passageiros fossem liberados em
primeiro lugar.
Naturalmente os documentos dos dois viajantes estavam corretíssimos, com
as devidas autorizações de seus responsáveis na África do Sul e com o visto de
entrada no Brasil. Assim, os dois garotos saíram para o saguão do aeroporto de
Viracopos sem qualquer suspeita de que aquele era o aeroporto errado.
A partir daquele momento, cada movimento dos dois era observado, anotado
e relatado a um agente que estava com o celular na mão, em contato com o
agente de óculos escuros, no aeroporto de Cumbica.
— Os dois entraram no banheiro, Doutor Pacheco. Quer que a gente vá ver o
que eles estão fazendo?
— O que eles estão fazendo no banheiro eu sei, seu cretino! — gritou a voz do
Doutor Pacheco, do outro lado da linha. — Verifique apenas se alguém os seguiu.
Veja se eles saem sozinhos de lá!
Os dois pareciam agir com calma. Foram até a bomboniere do saguão e
compraram alguma coisa. Saíram do aeroporto e postaram-se no fim da fila dos
táxis enfileirados à frente do aeroporto. Se algum deles coçava a cabeça ou
metia as mãos nos bolsos, o Doutor Pacheco ficava sabendo na mesma hora.
— Um deles está metendo o dedo no nariz, Doutor Pacheco!
— Um deles está metendo o dedo no nariz, Crânio! — repetiu o Doutor
Pacheco para o rapaz ao lado dele.
— Continue ouvindo, Doutor Pacheco. Isso não deve ser um sinal.
Em certo momento, o agente comunicou ao Doutor Pacheco que os
nazistinhas mostravam-se perturbados.
— Aí está! — gritou Crânio. — Estão nervosos porque já fizeram o sinal e não
apareceu ninguém! Seus agentes não conseguiram perceber o sinal, Doutor
Pacheco!
De Viracopos, o agente informou que os garotos tinham voltado à
bomboniere e comprado mais alguma coisa.
— É isso! — exclamou Miguel, batendo na testa. — O sinal é a compra na
bomboniere. Mande os seus agentes esperarem que os garotos se distanciem e
depois descubram o que eles disseram à vendedora, o que perguntaram, tudo!
O Doutor Pacheco transmitiu a ordem e, em poucos minutos, veio a resposta:
— Engraçado, Doutor Pacheco... O mais velho falou em português!
— Ele está bem treinado para vir para o Brasil, Doutor Pacheco — comentou
Crânio. — Pergunte o que o garoto falou!
— O que ele disse? — perguntou o Doutor Pacheco, ao telefone.
— Ele pediu chicletes e disse à moça da bomboniere que chocolate faz mal
para quem tem pele muito branca. Coisa mais idiota de se di...
— Idiota é você! — berrou o Doutor Pacheco. — Preste atenção no serviço e
guarde seus comentários para você mesmo!
— Espere, Doutor Pacheco! — a voz vinha preocupada, do outro lado. — O
menor deles está chorando!
— Isso deve ser outra senha, Calú — concluiu Miguel, depois de receber a
informação através do Doutor Pacheco.
— Estão prontos?
— Claro que sim! — riu Chumbinho muito decidido.
— Então, boa sorte, meninos! — sussurrou Andrade.
— Por que você não deseja "merda" para nós?
— Hein?
— Nada, Andrade... — sorriu Calú. — Você não é de teatro, né?
Em Viracopos, os dois nazistinhas de verdade começaram a mostrar sinais de
pânico. Foram até o balcão de informações e o mais velho reclamou
esclarecimentos, em bom português.
Depois de algum tempo, uma agente federal muito solícita, que se fazia
passar por funcionária da companhia aérea, concordou que aquele não era o
aeroporto onde os dois jovens pensavam estar desembarcando.
— Desculpem... — disse ela, sorrindo. — Vamos providenciar para que vocês
dois sejam embarcados imediatamente para o aeroporto onde estão sendo
esperados. Acompanhem-me, por favor...
Foi assim que, "por engano" e sem que os dois garotos desconfiassem, eles
foram gentilmente embarcados em um voo para Sydney, na Austrália, que
decolaria naquele momento. Desse modo, os dois nazistinhas só poderiam
comunicar-se com a Organização quando o avião fizesse escala!
A Polícia Federal teria cerca de doze horas para agir antes que a troca fosse
descoberta.
Carregando sacolas de mão como qualquer passageiro que desembarca, Calú
e Chumbinho saíram para o saguão do aeroporto de Cumbica. Na sacola de Calú
estava instalado um transmissor, menor que uma moedinha, que emitia bips para
um aparelho receptor instalado em um carro da Polícia Federal.
Calú e Chumbinho agiram com a maior tranqüilidade do mundo e dirigiram-se
à bomboniere.
Calú pediu chicletes, falando em português, com um leve e perfeito sotaque
alemão.
A moça da bomboniere sorriu para ele, falando com um sotaque bem mais
carregado:
— Os meninos não querem chocolate?
— Chocolate faz mal para quem tem pele muito branca — respondeu Calú.
Sussurrando, a moça informou no mesmo instante:
— Tudo está bem. Podem ir para o local de encontro.
Calú sentiu-se gelar. E agora? Onde era o tal local de encontro? Os dois
alemãezinhos haviam saído para o final da fila dos táxis. Seria lá?
— Venha! — comandou Calú.
Chumbinho procurava assumir um ar de "Esperado", embora ele não fizesse a
menor ideia de como deve agir um menino que está sendo esperado por uma
associação de nazistas.
Andaram calmamente para o ponto de táxis, na saída do aeroporto. Do ponto
de táxis, um dos motoristas começou a vir na direção deles. Naquele momento,
Calú concluiu que Chumbinho deveria agir como agira o verdadeiro Max Godson
em Viracopos.
— Chore, Chumbinho! — sussurrou Calú.
— Como?
— Chore! Esgoele-se como um garotinho!
E Chumbinho fez o maior escarcéu!
Os motoristas de táxi estranharam ao ver aquele garoto chorando tão
desconsoladamente. O motorista que vinha vindo parou. Outros dois começaram
a se aproximar, com aquele jeitão de adulto que vem socorrer criança. Em volta,
alguns "transeuntes" aproximaram-se. Eram, sem dúvida, os agentes do Doutor
Pacheco.
Foi nesse momento que, em diferentes pontos do aeroporto de Cumbica,
ouviram-se explosões ensurdecedoras!
Um pandemônio dos diabos tomou conta do aeroporto. As explosões
provocaram nuvens de fumaça, e uma gritaria de final de campeonato de futebol
ressoou pelos enormes vãos livres do prédio do aeroporto.
Alguma coisa rolou pelo chão entre os garotos e o grupo de "transeuntes",
bateu na parede e começou a silvar, soltando um forte jato branco.
Uma bomba de fumaça!
Quase abafado pelo ruído das explosões, um outro ruído aproximou-se por
cima deles. Calú levantou os olhos.
Era o ruído das pás de um helicóptero!
— Kommen Sie! — ordenou uma voz, atrás do garoto.
Calú voltou-se. Era a moça da bomboniere que segurava seu braço e o
empurrava. O motorista de táxi havia agarrado Chumbinho, e os dois foram
empurrados por alguns metros na direção do helicóptero que pousava. Braços
fortes puxaram os dois para bordo.
— Sieg Heil!
A sacola caiu das mãos de Calú quando o helicóptero levantou vôo.

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