terça-feira, 22 de outubro de 2013

Capítulo 12 - A Profecia de Durga

Levantei-me devagar, bati a poeira dos braços e
encontrei a lanterna. Senti a mão de Ren agarrar o meu ombro
enquanto ele me fazia girar e me examinava.

- Kelsey, você está bem? Você se machucou?

- Não. Estou bem. Então, acabamos aqui? A caverna
de Kanheri foi divertida e tudo o mais, só que agora eu queria
ir para casa.
- Sim - concordou Ren. - Vamos voltar para o carro.
Fique bem perto de mim. Animais que estavam dormindo
quando atravessamos a selva estão acordados agora, e caçando.
Precisamos ter cuidado.

Ele apertou o meu ombro, metamorfoseou-se

novamente em tigre e se dirigiu para o meio das árvores.

Parecia que estávamos no lado mais distante das

cavernas, talvez um quilômetro além delas, na base de um
morro íngreme. Ren me guiou, contornando o morro até os
degraus de pedra que havíamos subido tantas horas atrás.

Na verdade, era melhor andar pela selva à noite, já que

eu não podia ver todas as criaturas assustadoras que
certamente nos espiavam, mas, depois de uma hora e meia, eu
nem me importava se havia animais me observando ou não.
Estava morta de cansaço. Mal conseguia manter os olhos
abertos e as pernas em movimento.

Bocejando pela centésima vez, perguntei outra vez a Ren:


- Já chegamos?


Ele rosnou em resposta e então parou repentinamente,

abaixou a cabeça e espreitou a escuridão.

Com os olhos fixos na selva, Ren se transformou em homem e sussurrou:


- Estamos sendo caçados. Quando eu disser corra, vá

por ali e não olhe para trás... Corra!

Ele apontou para a minha esquerda e se lançou dentro

da floresta escura como tigre. Logo ouvi um rugido
impressionante e ameaçador sacudir as árvores. Despertando
meu corpo cansado, saí em disparada. Não tinha a menor ideia
de para onde estava indo, mas tentei me manter na direção que
ele apontara. Corri pelo meio da selva por cerca de 15 minutos
antes de reduzir o ritmo. Respirando pesadamente, parei e
fiquei escutando os sons na escuridão.

Ouvi felinos, felinos grandes, lutando. Pareciam estar a

mais de um quilômetro dali, mas eram ruidosos. Outros
animais estavam em silêncio. Deviam estar ouvindo a briga também.

Rosnados e rugidos profundos ecoavam pela selva.

Pareciam vir de mais do que dois animais e comecei a me
preocupar com Ren. Andei por outros 15 minutos, os ouvidos
atentos, tentando distinguir os sons de Ren do som dos outros
animais. De repente, fez-se um silêncio mortal.

Será que ele os afugentou? Será que está bem? Devo

voltar e tentar ajudá-lo?

Morcegos voejavam acima de minha cabeça à luz da

lua, enquanto eu refazia meus passos apressadamente. Eu
havia percorrido cerca de meio quilômetro no que esperava
fosse a direção certa quando ouvi estalos e um farfalhar nos
arbustos e vi um par de olhos amarelos me observando da escuridão.

- Ren? É você?


Uma forma emergiu dos arbustos e se abaixou, me observando.


Não era Ren.


Uma pantera negra me encarava, avaliando minha

capacidade de luta. Eu não me mexi. Sabia que, se me movesse,
ela saltaria imediatamente sobre mim. Empertiguei-me em
minha altura máxima e tentei parecer grande demais para ser comida.

Analisamos uma à outra por mais um minuto. Então, a

pantera saltou. Num momento ela estava agachada, a cauda
batendo de um lado para outro, e no momento seguinte ela
acelerava na direção da minha cabeça.

As garras afiadas da pantera estavam estendidas e

reluziam à luz da lua. Paralisada, fiquei ali, olhando as garras e
a bocarra cheia de dentes do felino que se aproximava,
rosnando, do meu rosto e do meu pescoço. Gritei, ergui as
mãos para proteger a cabeça e esperei que garras e dentes
rasgassem minha garganta.

Ouvi um rugido, senti uma lufada de ar roçar o meu

rosto e então... nada. Abri os olhos e girei, procurando a pantera.

O que aconteceu? Como ela pode ter errado o salto?


Um lampejo branco e preto rolou entre as árvores. Era

Ren! Ele havia atacado a pantera em pleno ar e a tirara de meu
caminho. A pantera grunhiu para Ren e o rodeou por um
momento, mas Ren rosnou de volta e deu com a pata na cara
dela. A pantera, não querendo enfrentar um felino duas vezes
maior que ela, rugiu novamente e disparou selva adentro.

A espectral silhueta branca e preta de Ren mancou em

meio às árvores até mim. Havia arranhões cobertos de sangue
nas suas costas e a pata direita estava machucada, talvez
quebrada, fazendo-o mancar. Em um segundo, ele se
transformou em homem e caiu aos meus pés, arfando. Segurou a minha mão.

- Você está ferida? - perguntou ele.


Abaixei-me perto dele e abracei seu pescoço com força,

aliviada por ambos termos sobrevivido.

- Estou bem. Obrigada por me salvar. Estou tão feliz

que você esteja vivo. Consegue andar?

Ren assentiu, me dirigiu um sorriso débil e retornou à

sua forma de tigre branco. Com uma lambida na pata, ele
inspirou profundamente e começou a andar.

- Então vamos. Estou bem atrás de você.


Mais uma hora de caminhada e chegamos ao Jeep.

Cansados demais para fazer qualquer outra coisa, bebemos
litros de água cada um, rebatemos o banco traseiro e nos
deitamos. Caí em um sono profundo, com o braço apoiado em Ren.

O sol se ergueu rápido demais e começou a esquentar o

carro. Acordei empapada de suor. Meu corpo inteiro estava
dolorido e imundo. Ren também estava exausto e ainda
sonolento, mas seus arranhões não pareciam tão ruins. Na
verdade, surpreendentemente, estavam quase cicatrizados. Eu
sentia minha língua áspera e grossa, e tinha uma dor de cabeça terrível.

Gemi ao me sentar.


- Argh, eu me sinto péssima, e nem tive que lutar

com panteras. Um chuveiro e uma cama macia são tudo de que
preciso. Vamos para casa.

Abrindo a mochila, verifiquei cada uma das câmeras e

os desenhos de carvão e os guardei antes de dar partida no Jeep
e me misturar ao trânsito matinal.

Quando chegamos, o Sr. Kadam surgiu correndo pela

porta e começou a me encher de perguntas. Entreguei-lhe a
mochila e caminhei como um zumbi na direção da casa,
murmurando:

- Chuveiro. Dormir.


Subi as escadas, tirei as roupas sujas e entrei no boxe.

Quase dormi em pé sob a água morna que batia nas minhas
costas, massageando minhas dores e lavando o suor e a lama.
Obriguei-me a despertar para ensaboar o cabelo e não sei
como consegui sair e me secar. Vesti o pijama e caí na cama.

Cerca de 12 horas depois acordei diante de uma

bandeja coberta e me dei conta de que estava morrendo de
fome. O Sr. Kadam havia se superado. Uma pilha de crepes se
erguia ao lado de um prato de rodelas de banana, morangos e
mirtilos, acompanhados de calda de morango, uma tigela de
iogurte e uma caneca de chocolate quente. Ataquei meu lanche
da meia-noite. Comi todos os deliciosos crepes e então levei o
chocolate para a varanda.

Estava frio do lado de fora, então me aconcheguei em

uma cadeira confortável, me enrolei na minha colcha e fiquei
bebericando o chocolate quente. Uma brisa soprava meus
cabelos no rosto e, quando levei a mão para afastá-los, percebi,
desolada, que de tão cansada eu esquecera de penteá-los
depois do banho. Fui pegar a escova e voltei para minha
cadeira aconchegante.

Escovar meu cabelo já era bem difícil depois do banho.

Deixá-lo secar sem pentear era um erro imperdoável. Ele
estava cheio de nós e eu não havia feito muito progresso
quando a porta no fim da varanda se abriu e Ren apareceu. Dei
um gritinho, assustada, e me escondi atrás dos cabelos. Perfeito, Kells.

Ele ainda estava descalço, mas vestia calça cáqui e uma

camisa de botões azul-celeste que combinava perfeitamente
com seus olhos. O efeito era magnético e ali estava eu em um
pijama de flanela com uma moita gigantesca na cabeça.

Ren se sentou diante de mim e disse:


- Boa noite, Kelsey. Dormiu bem?

- Dormi. E você?

Ele exibiu seu sorriso branco deslumbrante e assentiu

levemente com a cabeça.

- Você está com algum problema? - perguntou,

observando com uma expressão divertida minha tentativa de
desembaraçar os cabelos.
- Não. Está tudo sob controle. - Eu queria desviar
sua atenção do meu cabelo, então disse: - Como estão suas
costas e seu... braço?

Ele sorriu.


- Estão ótimos. Obrigado por perguntar.


- Ren, por que você não está usando branco? Até

agora não tinha visto você com roupas de outra cor. É porque
sua camisa branca rasgou?
- Não - respondeu ele. - Eu só quis usar alguma
coisa diferente. Na verdade, quando mudo para a forma de
tigre e volto, minhas roupas brancas reaparecem. Se eu
mudasse para tigre agora e então voltasse à forma humana,
estas roupas seriam substituídas pelas velhas brancas.
- Elas ainda estariam rasgadas e sujas de sangue?
- Não. Quando reapareço, elas estão limpas e inteiras novamente.
- Ah. Sorte sua. Seria bem embaraçoso se você
aparecesse nu toda vez que se transformasse.

Tive vontade de morder a língua assim que as palavras

saíram e corei de vergonha. Tentei encobrir minha mancada
jogando o cabelo para a frente do rosto e lutando com os nós.

Ele sorriu.


- É. Sorte minha.


Puxei a escova pelo cabelo e me encolhi.


- Isso levanta outra pergunta.


Ren se pôs de pé e pegou a escova da minha mão.


- O que... o que você está fazendo? - gaguejei.

- Relaxe. Você está muito nervosa.

Ele não fazia idéia.


Colocando-se atrás de mim, Ren pegou uma mecha do

meu cabelo e começou a escová-lo delicadamente. A princípio
fiquei nervosa, mas suas mãos em meu cabelo eram tão
quentes e reconfortantes que logo relaxei na cadeira, fechei os
olhos e deixei a cabeça cair para trás.

Depois de um minuto de escovação, ele afastou uma

mecha do meu pescoço, inclinou-se e sussurrou no meu ouvido:

- O que você queria me perguntar?


Levei um susto.


- Ah... o quê? - murmurei, confusa.

- Você queria me fazer uma pergunta.
- Ah, sim. Era... é... isso é gostoso.

Será que eu disse isso em voz alta?


Ren riu baixinho.


- Isso não é uma pergunta.


É, acho que disse.


- Era alguma coisa sobre eu me transformar em

tigre?
- Ah, sim. Agora lembrei. Você pode mudar para
uma forma e outra várias vezes por dia, certo? Tem um limite?
- Não. Não tem limite, desde que eu não assuma a
forma humana por mais de 24 minutos a cada 24 horas. - Ele
passou para outra seção do cabelo. - Mais alguma pergunta?
- Sim... sobre o labirinto. Você estava usando seu
faro, mas tudo o que eu sentia era um cheiro horrível de
enxofre. O que você estava seguindo?
- Na verdade, eu estava seguindo o aroma da flor de
lótus. É a flor favorita de Durga, a mesma que está no Selo.
Deduzi que aquele era o caminho certo a seguir.

Ren terminou com o meu cabelo, pousou a escova na

mesa e então começou a massagear levemente meus ombros.
Mais uma vez fiquei tensa, mas as mãos dele eram tão quentes
e a massagem tão gostosa que me recostei na cadeira e comecei
lentamente a derreter.

Em estado de extrema tranquilidade, minha voz soou

arrastada e indistinta:

- Aroma de lótus? Como você podia sentir esse odor

com todos os cheiros fortes de lá?

Ele tocou meu nariz com a ponta do dedo.


- Faro de tigre. Posso sentir o cheiro de muitas coisas

que as pessoas não percebem. - Ele apertou meus ombros uma
última vez e disse: - Pronto, Kelsey. Vá se vestir. Temos
trabalho a fazer.

Ren deu a volta até a frente da cadeira e me ofereceu

sua mão. Pus a minha na dele e senti centelhas elétricas
formigarem e percorrerem o meu braço. Ele sorriu e me beijou os dedos.

Atarantada, perguntei:


- Você sentiu isso também?


O príncipe indiano piscou o olho para mim.


- Certamente.


Alguma coisa na forma como ele disse "certamente" fez

com que eu me perguntasse se estávamos falando da mesma coisa.

Depois de me vestir, desci para a sala do pavão e

encontrei o Sr. Kadam debruçado sobre uma mesa grande onde
havia vários livros empilhados. Ren, o tigre, encontrava-se
acomodado ao lado dele em um divã.

Arrastei outra cadeira até a mesa e empurrei para um

lado uma grande pilha de livros, para que eu pudesse ver em
que o Sr. Kadam estava trabalhando.

Ele esfregou os olhos cansados e vermelhos.


- Está trabalhando nisto desde que chegamos em

casa, Sr. Kadam?
- Sim. É fascinante! Já traduzi o que estava escrito
na impressão que você fez com o carvão e agora estou
trabalhando nas fotos que tirou do monólito.

Ele me entregou suas anotações.


- Poxa, o senhor trabalhou um bocado! - comentei,

admirada. - O que acha que "quatro oferendas" e "cinco
sacrifícios" significam?
- Não tenho certeza - replicou o Sr. Kadam -, mas
acho que pode significar que sua busca ainda não acabou.
Deve haver mais tarefas que você e Ren precisam realizar antes
que o feitiço seja quebrado. Por exemplo, acabei de traduzir
um dos lados do monólito e ele indica que vocês têm que ir a
outro lugar buscar um objeto, uma oferenda, que vocês darão a
Durga. Terão que encontrar quatro oferendas. Meu palpite é
que haja uma oferenda diferente mencionada em cada lado do
monólito. Receio que estejam apenas no primeiro degrau dessa jornada.


















- Entendi. Então o que diz esse primeiro lado?

O Sr. Kadam empurrou um pedaço de papel na minha direção.






















- Sr. Kadam, o que é o reino de Hanuman?
- Estou pesquisando isso - respondeu. - Hanuman é
o deus macaco. Dizem que seu reino é Kishkindha, ou o Reino
dos Macacos. Existe uma grande polêmica quanto à localização
de Kishkindha, mas, de acordo com o pensamento corrente, o
mais provável é que as ruínas de Hampi estejam sobre a antiga Kishkindha, ou perto dela.

Dentre a pilha na mesa, puxei um livro que tinha

mapas detalhados, encontrei Hampi no índice e folheei as
páginas. Hampi se localizava na metade inferior da Índia, na região sudoeste.

- Isso significa que temos que ir para Kishkindha,

enfrentar um deus macaco e encontrar um tipo de galho?
- Acredito que o que vocês vão procurar seja, na
verdade, o fruto proibido - respondeu o Sr. Kadam.
- Como Adão e Eva? É desse fruto proibido que o
senhor está falando?
- Não. O fruto é uma recompensa mitológica
bastante comum, que simboliza a vida. As pessoas precisam
comer e dependemos dos frutos da terra para nosso sustento.
Diferentes culturas celebram os frutos ou a colheita de formas variadas.

O Sr. Kadam sorriu e voltou para suas traduções.


Peguei alguns livros sobre a cultura e a história da

Índia, segui para uma poltrona confortável e sentei-me com
uma almofada para ler. Ren saltou do banco e enroscou-se aos
meus pés, ou melhor, em cima dos meus pés, mantendo-os
aquecidos, enquanto o Sr. Kadam continuava a pesquisar em sua mesa.

Tive a sensação de estar de volta à biblioteca dos meus

pais. Parecia natural me sentar ali, relaxada, na companhia
daqueles dois, embora eles estivessem sob o efeito de elementos
não naturais. Estendi a mão para coçar Ren atrás da orelha. Ele
ronronou, contente, mas não abriu os olhos. Então dirigi um
sorriso ao Sr. Kadam, embora ele não o tivesse visto. Eu me
sentia feliz e completa, como se pertencesse àquele lugar.
Deixando de lado minhas reflexões, encontrei um capítulo
sobre Hanuman e comecei a ler.

"Ele é um deus hindu, a personificação da devoção e da

grande força física. Serviu ao seu senhor Rama indo para Lanka
encontrar a esposa de Rama, Sita."

Puxa... quantos nomes.


"Lá descobriu que ela havia sido capturada pelo rei de

Lanka, chamado Ravana. Houve uma grande batalha entre
Rama e Ravana, e, durante esse período, o irmão de Rama
adoeceu. Hanuman foi até a cordilheira do Himalaia procurar
uma erva para ajudar a curar o irmão de Rama, mas não
conseguiu identificar a erva e, então, trouxe de volta toda a montanha."

Eu me pergunto como exatamente ele moveu a

montanha. Espero que não tenhamos que fazer isso.

"Hanuman tornou-se imortal e invencível. Ele é meio

humano e meio macaco, além de ser mais rápido e mais
poderoso que todos os outros símios. Filho de um deus do
vento, Hanuman ainda hoje é venerado por muitos hindus, que
todos os anos cantam seus hinos e celebram seu nascimento."

- Homem-macaco forte, capaz de mover montanhas, cantor. Entendi - murmurei, sonolenta.


A noite avançava e eu me sentia cansada, apesar de meu

longo repouso mais cedo. Pus o livro de lado e, com Ren ainda
enroscado nos meus pés, cochilei um pouco.

Deixei o Sr. Kadam sozinho na maior parte do dia

seguinte, encorajando-o a dormir um pouco. Ele ficara
acordado a noite toda, então procurei me movimentar pela
casa em silêncio.

No fim da tarde, ele me visitou na varanda. Sorria

quando nos sentamos.

- Srta. Kelsey, como está passando? Esses fardos

devem estar sendo muito pesados para a senhorita,
principalmente agora que sabemos que vocês têm outras
jornadas pela frente.
- Estou bem, de verdade. O que é um pouco de suco
de besouro entre amigos?

Ele sorriu, mas logo sua expressão tornou a ficar séria.


- Se sentir que está sendo exigida demais... eu... eu

não quero colocá-la em perigo. A senhorita se tornou muito
importante para mim.
- Está tudo bem, Sr. Kadam. Não se preocupe. Foi
para isso que eu nasci, não foi? Além disso, Ren precisa da
minha ajuda. Se eu não o ajudar, ele vai ficar condenado ao
corpo de um tigre para sempre.

O Sr. Kadam deu tapinhas na minha mão.


- A senhorita é muito brava e corajosa. Uma jovem

admirável, como não vejo há muito, muito tempo. Espero que
Ren perceba a sorte que tem.

Corei e olhei para a piscina.


- Pelo que deduzi até agora - prosseguiu ele -,

precisamos ir agora para Hampi. A distância até lá é grande
demais para vocês dois irem sozinhos. Vou acompanhá-los
nessa jornada. Partiremos amanhã cedo. Quero que você
descanse o máximo possível hoje. Ainda temos algumas horas
de luz do dia. Você deve relaxar. Por que não dá um mergulho na piscina?

Depois que o Sr. Kadam saiu, pensei no que ele dissera.

Nadar seria relaxante.

Vesti um maiô, passei filtro solar e mergulhei na água fresca.


Nadei dando várias voltas na piscina e então fiquei

boiando de costas, olhando as palmeiras que se erguiam acima
de mim. O sol já estava na altura das árvores, mas o ar ainda
era quente e agradável. Ouvi um ruído na lateral da piscina e
vi Ren deitado na borda me observando nadar.

Mergulhei, nadei até onde ele estava e então botei a

cabeça para fora da água.

- Ei, Ren.


Joguei água nele e ri. O tigre branco resmungou, bufando.


- Não quer brincar? Certo, como quiser.


Nadei mais um pouco e finalmente decidi que era

melhor entrar, pois meus dedos estavam murchos feito ameixas
secas. Enrolando meu corpo e meu cabelo numa toalha, segui
em direção à escada para tomar um banho. Saí do banheiro e
encontrei Ren deitado no tapete. Havia uma rosa azul-
prateada sobre o meu travesseiro.

- Isto é para mim?


Ren emitiu um ruído de tigre que parecia querer dizer

sim.

Levando a flor ao nariz, aspirei profundamente a doce

fragrância e me deitei de bruços para olhar o tigre ao lado da
minha cama.

- Obrigada, Ren. É linda!


Dei-lhe um beijo no alto da cabeça peluda, cocei atrás

de suas orelhas e ri quando ele inclinou a cabeça para que eu
coçasse mais.

- Quer que eu leia um pouco mais de Romeu e Julieta para você?


Ele ergueu uma pata e a colocou na minha perna.


- Acho que isso significa sim. Muito bem, vamos ver.

Onde estávamos? Ah, Ato II, Cena III. Entram Frei Lourenço e Romeu em seguida.

Tínhamos acabado a cena em que Romeu mata

Teobaldo quando Ren me interrompeu.

- Romeu era um tolo - disse ele, repentinamente na

forma humana. - Seu grande erro foi não anunciar o
casamento. Ele devia ter contado para as duas famílias. Manter
o casamento em segredo é o que vai destruir Romeu. Segredos
assim podem ser a ruína de qualquer homem. Quase sempre
são mais destrutivos do que a espada.

Ren então ficou quieto, perdido em pensamentos.


- Devo continuar? - perguntei.

Ele despertou da momentânea melancolia e sorriu.
- Por favor.

Mudei de posição, recostando-me na cabeceira, e puxei

uma almofada para o meu colo. Ele voltou à forma de tigre e
saltou para o pé da cama. Estirou-se de lado sobre o imenso
colchão.

Recomecei a ler. Todas as vezes que eu lia alguma coisa

de que Ren não gostava, ele abanava a cauda, aborrecido.

- Pare com essa cauda, Ren! Está fazendo cócegas

nos meus pés!

Essa declaração só o estimulou a repetir ainda mais o

gesto. Quando cheguei ao fim da peça, fechei o livro e olhei
para Ren, querendo ver se ainda estava acordado. Estava, e
havia voltado à forma humana. Ainda se encontrava deitado de
lado no pé da cama, com a cabeça apoiada no braço.

- O que achou? - perguntei. - Ficou surpreso com o desfecho?


Ren pensou antes de responder.


- Sim e não. Romeu tomou algumas decisões ruins

ao longo de toda a história. Estava mais preocupado consigo
mesmo do que com a mulher. Ele não a merecia.
- O final o desagradou tanto assim? A maioria das
pessoas se concentra no romance que há na peça, na tragédia
de nunca poderem ficar juntos. Lamento que não tenha
gostado.

O rosto pensativo de Ren se alegrou.


- Ao contrário, gostei bastante. Não tenho ninguém

com quem conversar sobre peças de teatro ou poesia faz... bem,
desde que meus pais morreram. Para falar a verdade, eu
costumava escrever poesia.
- Também sinto falta de ter alguém com quem conversar - admiti baixinho.

O lindo rosto de Ren se iluminou com um sorriso

caloroso e eu de repente fiquei preocupada com um fiapo na
manga da minha blusa. Ele saltou da cama, pegou minha mão e
fez uma mesura profunda.

- Talvez, da próxima vez, eu leia um poema meu para você.


Ele virou minha mão e depositou um beijo suave e

demorado na palma. Seus olhos cintilaram, travessos.

- Deixo-a com um "beijo. Boa noite, Kelsey.


Ren fechou a porta silenciosamente atrás de si e eu

puxei as cobertas até o queixo. A palma de minha mão ainda
formigava no local onde ele a beijara. Tornei a cheirar minha
rosa, sorri e a enfiei no arranjo sobre a cômoda.

Ajeitando-me sob as cobertas, suspirei, sonhadora, e

adormeci.

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