quinta-feira, 6 de março de 2014

Capítulo 7 - Volta às aulas


Na manhã seguinte Ren ligou para ver se podíamos tomar o 
café da manhã juntos e assistir a um filme. Eu disse que sim e 
desliguei o telefone. Meu corpo estava um pouco dolorido da queda, 
então engoli umas aspirinas e tomei um banho quente. 

O cheiro de panquecas queimadas flutuava escada acima. 
Encontrei Ren na cozinha Fatias de bacon chiavam no fogão e ele 
batia ovos numa tigela grande 

Meu avental de babados estava amarrado em sua cintura. Era 
uma visão e tanto. 

— Por que não pediu minha ajuda, Ren? — perguntei, tirando 
a panqueca queimada da frigideira. 

— Eu queria fazer uma surpresa para você. 

— Isso com certeza é uma surpresa. — Eu ri e assumi o fogão. 
— Para que a manteiga de amendoim? 


— Para fazer panqueca de banana com manteiga de 
amendoim, é claro. 

Eu ri. 

— Ë mesmo? Como foi que você conseguiu criar isso? 

— Tentativa e erro. 

— Muito bem. Mas você também tem que experimentar 
panquecas à minha moda, com gotas de chocolate. 

— Combinado. 

Quando eu tinha uma pilha de panquecas alta o suficiente 
para satisfazer Ren, nos sentamos para comer. Ele provou um grande 
pedaço. 

— E então? O que acha? 

— Excelente. Mas ficariam ainda melhores com manteiga de 
amendoim e banana. 

Estendi a mão para pegar a calda, revelando um hematoma 
longo e arroxeado no braço. Ren notou imediatamente e tocou meu 
braço com cuidado. 

— O que foi isso? O que aconteceu com você? 

— O quê? Ah... isso. Tentei evitar que uma senhora fosse 
atropelada por cm carro que se aproximava e ele bateu em mim. Eu 
cai. 

Ren se levantou do banco de um pulo e me examinou e 
cutucou, apalpando meus ossos e movimentando minhas articulações 
com todo o cuidado. 

— Onde dói? 

— Ren! É sério, eu estou bem. São só alguns cortes e 
arranhões. Ai! Não aperte aí! — Dei um tapa nele. — Pare com isso! 


Você não é médico. São só umas contusões bobas. Além do mais, 
Jason estava lá comigo. 

— Ele também foi atingido pelo carro? 

— Então não estava lá com você. Da próxima vez que eu 
encontrar esse cara, ele vai ficar com umas contusões semelhantes 
para que possa saber o que você sentiu. 

— Ren, pare de fazer ameaças. Isso não importa mais. Eu disse 
a Jason que não queria mais sair com ele. 

Ren abriu um sorriso de satisfação. 

— Ótimo. Mas o garoto ainda precisa aprender umas 
coisinhas. 

— Ah, mas não é você que tem que ensinar a ele. Só por isso 
vou escolher o filme. E já vou avisando: pretendo pegar o filme mais 
mulherzinha que encontrar. 

Ele grunhiu, resmungou alguma coisa sobre rivais, contusões e 
garotas e voltou para suas panquecas. 

Depois do café da manhã, Ren me ajudou a arrumar a cozinha, 
mas o estressadinho ainda não estava livre de sua punição. Coloquei o 
filme, sentei-me ao lado dele com um sorrisão na cara e esperei que 
começasse a reclamar. O crescendo do tema de abertura de A noviça 
rebelde começou e dei uma risadinha, sabendo que ele iria sofrer pelas 
próximas horas. Só que... Ren adorou. Ele pôs o braço em meus 
ombros e ficou brincando com a fita na ponta da minha trança. E 
assoviou, acompanhando as canções. 

Fez uma pausa no meio do filme, foi buscar o bandolim e 
começou a tirar a musica. O bandolim tinha um som mais exótico que 
o violão no filme. 

— É lindo! — exclamei. — Há quanto tempo você toca? 


— Comecei depois que você partiu. Sempre tive bom ouvido 
para música minha mãe costumava pedir que eu tocasse para ela. 

— Mas você pegou “Edelweiss” muito rápido. Já tinha ouvido 
essa canção? 

— Não. Mas eu sempre fui capaz de tocar as notas só de ouvi-
las. 

Ele começou a tocar “My Favorite Things” e então a música 
mudou, tornando-se uma melodia triste porém bonita. Fechei os 
olhos, recostei a cabeça no sofá e senti a música me transportar numa 
viagem. A canção começou sombria e solitária, mas depois ficou doce 
e cheia de esperança. Eu tinha a sensação de que meu coração batia 
no mesmo ritmo da música. As emoções tomaram conta de mim à 
medida que a canção contava sua história. O final era melancólico e 
triste. Tive a sensação de que meu coração se partia. E foi aí que ele 
parou. 

Abri os olhos. 

— O que foi isso? Nunca ouvi nada assim! 

Ren suspirou e pousou o bandolim com cuidado na 
mesa. 

— Eu a compus depois que você viajou. 

— Você fez isso? 

— Fiz. O nome é “Kelsey’ É sobre você... sobre nós. É a 
nossa história juntos. 

— Mas o final é triste. 

Ele passou a mão nos cabelos. 

— Foi assim que me senti quando você partiu. 

— Ah. Mas nossa história ainda não chegou ao fim, não 
é? 


Cheguei mais perto de Ren e envolvi seu pescoço com os 
braços. 

Ele me apertou, pressionou o rosto em meu pescoço, sussurrou 
meu nome e disse: 

— Não. Certamente ainda não acabou. 

Tirei-lhe o cabelo da testa e disse baixinho: 

— É linda, Ren. 

Ele me abraçou bem apertado. Meu coração começou a bater 
mais rápido. Olhei seus olhos azuis intensos, em seguida os lábios 
perfeitamente esculpidos e quis que ele me beijasse. Ele aproximou 
ainda mais a cabeça, mas parou antes que seus lábios tocassem os 
meus. Estudou minha expressão, ergueu uma sobrancelha e se 
afastou. 

— O que foi? — perguntei. 

Ele suspirou e prendeu um cacho de cabelo atrás de minha 
orelha. 

— Eu não vou beijá-la enquanto estivermos nesse processo de 
escolha. Seus olhos examinavam meu rosto enquanto ele continuava: 
— Quero que você tenha a cabeça lúcida quando me escolher. Você 
fica toda vulnerável quando a toco, quanto mais quando a beijo. Eu 
me recuso a tirar vantagem disso. Uma promessa feita num momento 
de paixão não é duradoura e eu não quero que você tenha dúvidas ou 
arrependimentos em relação à sua 

— Espere um instante — arquejei, incrédula. — Vamos ver se 
entendi: você não vai me beijar porque acha que seus beijos me 
deixam tonta demais para pensar com clareza? Que eu sou incapaz de 
tomar uma decisão consciente se estiver embriagada de paixão por 
você? 

Ele assentiu com cautela. 


— Isso tem a ver com seus estudos antiquados de métodos de 
corte? Porque muitas dessas sugestões estão desatualizadas... 

— Sei disso, Kelsey. Eu só não quero pressioná-la 

Furiosa, pulei do sofá e comecei a andar em círculos. 

— Essa é a coisa mais maluca que já ouvi! 

Fui até a cozinha pegar um refrigerante e percebi que não 
estava apenas surpresa, estava com raiva, e parte da minha raiva vinha 
do fato de que ele não estava muito longe da verdade. Eu ficava, sim, 
completamente vulnerável sempre que ele me tocava. 

De repente me senti como um peão num dos jogos de 
tabuleiro de Li. Bem, as regras do jogo valiam para os dois. Decidi 
retaliar. Se ia haver uma guerra por mim, então por que eu também não 
podia lutar? As garotas têm um arsenal de armas inteiramente 
exclusivo, ponderei, enquanto planejava a estratégia de batalha. 
Daquele ponto em diante, decidi que testaria a resistência dele. Eu 
faria Ren me beijar. 

Coloquei meu plano imediatamente em ação. Voltamos ao 
filme e deitei a cabeça em seu ombro, meus lábios a poucos 
centímetros dos dele, e comecei a escrever pequenos círculos nas 
costas de sua mão. Minha atitude deixou-o nervoso. Ele ficava se 
contorcendo e mudando de posição, mas não me nem se afastou. 

Depois do filme Ren anunciou subitamente que nosso 
encontro tinha chegado ao fim. Gostei disso. O equilíbrio de poder 
mudou. Corri os dedos por seu bíceps volumoso, então tracei 
coraçõezinhos em seu antebraço e fiz beicinho. 

— Seu tempo como homem é tão curto. Não quer ficar 
comigo? 

Ele tocou meu rosto. 

— Mais do que quero respirar. 


Não pude evitar. Colei meu corpo ao dele. 

Ele me pegou e me sacudiu delicadamente. 

— Eu não vou beijar você, Kelsey. Não quero que fique confusa 
em relação ao que deseja. No entanto, se você optar por me beijar, 
não irei me opor. 

Afastando-me dele, rebati. 

— Rá! Pode esperar deitado. — Pus as mãos nos quadris e sorri 
com ironia. — Essa notícia deve ser um choque para um homem que 
sempre consegue o que quer. 

Ele deslizou as mãos pela minha cintura e me puxou para seu 
peito. Então levou os lábios a centímetros do meu. 

— Não... o que eu... mais quero. 

Ele hesitou por um instante, esperando que eu fizesse um 
movimento, mas não fiz. Estava determinada a levá-lo a me beijar 
primeiro. Assim, sorri e esperei. Estávamos presos numa silenciosa 
batalha de vontades. 

Por fim, ele se afastou. 

— Você é tentadora demais, Kelsey. O encontro terminou. 

De repente nada no mundo era tão importante para mim 
quanto vencer essa guerrinha com Ren. Inclinando-me para ele, 
pisquei inocentemente e, com a voz mais sedutora, perguntei. 

— Tem certeza absoluta de que precisa ir? 

Senti os músculos de seu braço se retesarem e a pulsação 
disparar. Ele segurou meu rosto com uma das mãos. Querendo levá-lo 
ao limite, coloquei a mão sobre a dele e depositei um beijo cálido em 
sua palma. Acariciando sua palma com os lábios, eu o ouvi prender a 
respiração. Eu não fazia a menor ideia de que ele reagia dessa forma a 
mim. Isso vai ser mais fácil do que pensei. 


Apertei seu braço levemente e me encaminhei para a escada, 
sentindo seus olhos em mim. Assumindo minha melhor 
personificação de Scarlett O’Hara, virei-me uma última vez e disse: 

— Bem... Tigre, se mudar de ideia, sabe onde me encontrar. 
Deslizei os dedos pelo corrimão e continuei a subir os degraus. 

Infelizmente ele não me seguiu. Eu imaginara Ren fazendo o 
papel de Rhett Butler e, incapaz de se conter, me tomando nos braços 
e me carregando escada acima numa dramática demonstração de 
paixão. No entanto, Ren me lançou um olhar divertido e saiu, 
fechando a porta silenciosamente. 

Droga! Ele tem mais autocontrole do que imaginei. 

Não importava. Era apenas um pequeno contratempo. Passei o 
resto do dia tramando... Como se pega um tigre muito velho e muito 
alerta de surpresa? Use as fraquezas dele: comida, artimanhas 
femininas, poesia e superproteção. O pobrezinho não tem a menor 
chance. 



Na manhã seguinte abri o lado do armário antes proibido, 
peguei um cardigã azul-marinho e uma saia estampada, um cinto fino 
e botas marrons de cano alto. Fiz escova no cabelo e caprichei na 
maquiagem, especialmente no gloss cor de pêssego nos lábios. 

Em seguida, preparei um sanduíche gigante para Ren — e 
coloquei um bilhetinho de amor em cima dele. Os dois podem jogar o 
jogo da poesia, pensei, convencida. 

 A alma que pode falar através dos olhos também pode 

beijar com o olhar. 


Gustavo Adolfo 
Becquer 




Quando ele veio me buscar para a faculdade, me olhou de 
cima a baixo e disse: 

— Você está linda, Kells, mas não vai funcionar. Já entendi 
qual é a sua. 

Ele me ajudou a vestir o casaco e eu respondi inocentemente: 

— Não sei do que você está falando. O que é que não vai 
funcionar? 

— Você está tentando me fazer beijá-la. 

Ergui o rosto para ele, sorrindo, e disse, acanhada: 

— Uma garota não deve entregar todos os seus segredos, não 
é? 

Ele se inclinou para mim, pressionou os lábios contra meu 
ouvido e sussurrou numa voz aveludada: 

— Muito bem, Kells. Guarde seus segredos. Mas estou de olho 
em você, O que quer que esteja tentando fazer não vai funcionar. Eu 
ainda tenho algumas cartas na manga também. 

Ren me deixou sozinha a tarde toda. Enfiei outro bilhete em 
sua mochila 

Enquanto ele saía do carro para a aula de wushu. 

As almas se encontram nos lábios dos enamorados. 

Percy Bysshe Shelley 



Estava sentada no chão me alongando quando o vi puxar o 
bilhete da bolsa. Ele o leu algumas vezes e então ergueu os olhos e 
interceptou meu olhar. Dirigi a ele um sorriso inocente e acenei 
alegremente para Jennifer, que cruzava a sala. 


De volta a casa, dentro da garagem, Ren abriu a porta do 
carro para mim. 

Mas, em vez de me ajudar a saltar, ele se inclinou e 
grunhiu suavemente. 

Seus lábios roçaram a pele sensível sob minha orelha. Sua voz 
era sedutora, perigosa. 

— Vou logo avisando, Kelsey. Sou um homem extremamente 
paciente. Fui treinado à exaustão a esperar o inimigo. Minha vida 
como tigre me ensinou que a persistência e a diligência sempre valem 
a pena. Considere-se advertida, priyatama. Eu estou numa caçada. Já 
farejei seu cheiro e nada vai me deter. 

Ele se afastou e estendeu a mão para me ajudar a saltar. Eu a 
ignorei e me dirigi à porta com as costas rígidas e as pernas trêmulas. 
Ouvi uma risadinha na brisa enquanto ele desaparecia do seu lado da 
casa. 

Ren estava me deixando maluca. Eu me sentia tentada a 
arrombar a porta e me atirar em cima dele, mas me recusava a ceder. 
Eu iria provocá-lo dessa vez. Faria com que ele pedisse demência. 

Logo descobri que a batalha de vontades entre mim e Ren 
havia empurrado Li para o canto mais afastado de minha mente. 
Sempre que estava com Li, meus pensamentos voavam para longe, 
ocupados em planejar maneiras de seduzir Ren. Era tão óbvio que Li 
percebeu. 

— Câmbio. Planeta Terra chamando Kelsey. Você vai notar 
minha presença agora? — perguntou Li, tenso, uma noite, durante 
um de seus filmes de artes marciais favoritos. 

— Como assim? 

— Kelsey, você está totalmente ausente nessa última semana. 
Sua cabeça anda longe. 


— Bem... é que voltei à faculdade agora e os trabalhos me 
distraem. 

— Não são os trabalhos, Kelsey. É ele. 

Senti remorso imediatamente. Li não havia feito nada de 
errado e o mínimo que eu podia fazer era lhe dar atenção. 

— Desculpe, Li. Eu não tinha percebido que estava ignorando 
você. Tem toda razão. Agora estou aqui com você, 100 por cento. Me 
fale de novo por que esse filme é um clássico na categoria. 

Li observou meu rosto por um momento e então começou a 
falar sobre Punhos de serpente, com Jackie Chan. Eu estava 
interessada de verdade e ele pareceu aliviado com isso. 

O restante da noite correu tranquilamente, mas eu sentia 
culpa em relação a Li. Não estava lhe dando a atenção que ele 
merecia. O pior era que eu queria que Ren estivesse assistindo ao 
filme conosco. 



Quando cheguei em casa aquela noite, já tarde, colei um 
bilhete no lado de Ren da porta de comunicação. 


Certa vez ele sugou 

Com um longo beijo, toda a minha alma através 

Dos meus lábios, como a luz do sol bebe o orvalho. 

Alfred Lord Jennyson 


Ren não havia me beijado em três semanas e eu achava que 
estava fraquejando mais do que ele. Eu tinha tentado de tudo e ainda 


não conseguira nem um selinho em meus lábios aflitos. Não tinha 
obtido nenhum resultado em semanas de esforço. Eu agora era dona 
de uma coleção completa de batons e brilhos labiais e já havia 
experimentado cada um deles, sem nenhum efeito. 

Na aula de wushu, ele tirou outro bilhete da bolsa, leu e 
ergueu uma sobrancelha em minha direção. Esse era o mais ousado 
que eu lhe dera e intencionalmente eu o deixara para o fim. Era 
minha última tentativa. 



Dá-me um beijo e depois mais vinte. 

Em seguida soma mais cem a essas vinte. 

E mil a esses cem assim continua a me beijar. 

Até esses mil a um milhão chegar. 

Triplica esse milhão, e estando terminado. 

Voltemos a nos beijar como havíamos começado. 



Robert Herrick 





Ren não disse nada, mas me olhou de forma intensa e ardente. 
Com audácia , Sustentei seu olhar e senti uma centelha se acender 
entre nós, formando um elo e abrindo um buraco no meu corpo, 
embora estivéssemos em lados opostos da sala. Eu não conseguia tirar 
os olhos dele e ele aparentemente estava sofrendo do mesmo mal. 

De repente Li anunciou que iríamos treinar movimentos para 
derrubar o oponente, o que ele havia evitado desde a primeira sessão 
com Ren. Dessa 


Li e Ren iriam demonstrar os movimentos para os Outros. Li 
instruiu e todos nos sentássemos junto à parede. Com relutância, Ren 
rompeu o contato visual comigo e se posicionou de frente para seu 
adversário. 

Os dois homens andavam em círculos. Li fez o primeiro 
movimento, um soco circular, para se exibir e se aproximar, mas Ren 
o bloqueou elegantemente. Li mudou o peso do corpo para uma 
perna, deu uma rasteira por trás dos joelhos e então desferiu um soco 
contra o peito de Ren. Este se deslocou para a direita, fazendo com 
que a rasteira de Li errasse o alvo, espalmada para bloquear o soco. 
Em seguida, Li realizou uma elaborada manobra, plantou a mão no 
chão e atacou com uma clássica tesoura. Ren agarrou o pé de Li e 
girou, derrubando-o com força de barriga para baixo. Li rolou no 
chão, afastando-se com raiva, e devolveu uma série de socos. Ren o 
bloqueou no alto, embaixo e até por trás, neutralizando com eficácia 
os ataques de Li. 

Li percebeu que não progredia, então simulou um soco para 
agarrar o braço de Ren e o puxou com força a fim de desferir-lhe um 
chute contra o rosto, mas Ren o fez perder o equilíbrio e Li caiu 
novamente no tatame. Ele se levantou com um salto, tornou a ficar de 
frente para Ren e eles voltaram a se mover em círculos. 

— Você quer mesmo continuar com isso? — perguntou Ren. 
— Já provou que é um bom lutador. 

— Não estou tentando provar nada. — Ele sorriu. — Só queria 
impedir que você continuasse devorando minha garota com os olhos. 

Ele disparou um soco duplo contra o peito de Ren, que 
simplesmente agarrou-lhe os pulsos e os girou para fora. Li uivou e se 
afastou, para voltar em seguida com um chute frontal no rosto de 
Ren. 

Dessa vez Ren agarrou-lhe o calcanhar. 


— Ela ainda não decidiu de quem ela é. — Ele ergueu os 
braços e empurrou Li, virando-o de cabeça para baixo. — Mas, se 
fosse para apostar, não consideraria suas chances muito boas. 

Arquejei, ofendida e constrangida. Ren voltou-se para me 
olhar. Vendo-o distraído, Li agarrou-lhe os braços por trás e forçou-os 
para cima, um movimento que imobilizaria a maioria das pessoas. 
Sem sequer pestanejar, Ren subiu uma parede com Li ainda 
segurando seus braços e girou no ar. 

Quando caiu, virou os pulsos, revertendo suas posições. Os 
cotovelos de Li agora se projetavam no ar enquanto Ren os forçava 
ligeiramente para baixo. Quando Li arfou de dor, Ren o soltou. Li 
rodou e tentou dar uma rasteira em Ren outra vez, mas Ren saltou 
sobre suas pernas, girou e imobilizou Li com facilidade. 

Jennifer me olhou, nervosa, e segurou minha mão. Li estava 
descontrolado. Ele limpou a boca e rebateu: 

— Deixe que eu me preocupe com as minhas chances. 

Então ele rodou e chutou, atingindo o peito de Ren. O impacto 
lançou anhos alguns passos para trás. Li provocou: 

— Pelo menos eu não desisti dela nem deixei que partisse. 

Os movimentos agora eram rápidos demais para que eu 
pudesse distingui-los. Eu via socos, bloqueios de braço e de perna, 
giros com recuo, chutes laterais e passos elaborados. 

A certa altura, Ren correu para Li e deu uma complicada 
cambalhota no ar, em posição encolhida, girou duas vezes e saltou 
por cima de Li. Quando estava descendo, pousou as mãos nas costas 
de Li e usou seu impulso para jogá-lo de cara no tapete. A turma 
começou a bater palmas e dar vivas. 

Ren pressionou a mão nas costas de Li, mantendo-o imóvel, e 
grunhiu baixinho: 


— Não. Mas é o que vai fazer. Ela é minha. 

Ren deixou que ele se levantasse e depois disso, Li se 
transformou num touro enfurecido, partindo com tudo para cima de 
Ren. O suor escorria de seu rosto e sua respiração estava pesada. Ele 
atacou com ainda mais violência do que antes e Ren intensificou seu 
ritmo um pouco também. Li finalmente estava conseguindo acertar 
uns golpes. Eu me sentia mortificada por eles lutarem por mim. Em 
público. Ao mesmo tempo, não conseguia tirar os olhos dos dois. 

Li era uma força a ser reconhecida. Era altamente habilidoso. 
No entanto, ainda havia um mundo de diferença entre ele e Ren. Era 
quase como se estivessem se movendo em duas velocidades 
diferentes. 

Fiquei observando Ren lutar. Na verdade, teria sido impossível 
desviar os olhos. Cada movimento era uma pintura. Eu me vi 
hipnotizada pelo controle calculado e pelo poder que exibia. Era 
simplesmente magnífico. Um lutador digno do tigre que era na maior 
parte do tempo. 

Eu estava furiosa com sua audácia de me declarar sua 
propriedade na frente de todos. No entanto, ao mesmo tempo, eu me 
sentia emocionada por vê-Io me desejar tão ferozmente. Ele era de 
fato um anjo guerreiro. Meu anjo guerreiro, pensei, possessiva. 

Após cerca de 15 minutos de luta acirrada sem chegar a lugar 
algum, Li, ofegando intensamente, dispensou a turma. Tentei falar 
com ele, mas ele fez um gesto com a mão, me dispensando e pegou 
uma toalha para cobrir a cabeça. 



Li não ligou nem me chamou para sair na semana que se 
seguiu. Depois da aula de wushu na sexta, ele pediu para falar comigo 
e disse a Ren que me levaria para casa. Ren assentiu e foi embora em 
silêncio. Eles vinham se tratando de maneira estranhamente 
civilizada desde a luta. 


Li se sentou e deu um tapinha no tatame, indicando que eu me 
sentasse ao lado dele. 

— Kelsey, preciso perguntar uma coisa a você e quero que 
responda com sinceridade. 

— Claro. 

— Por que você deixou Ren? 

Eu me remexi, desconfortável. 

— Eu o deixei porque... não éramos feitos um para o 
outro. 

— Como assim? 

Fiquei em silêncio por um momento e então respondi: 

— São várias razões. A principal é que... é difícil explicar. Em 
primeiro lugar, ele é lindo, eu não sou. Ele também é muito rico. Na 
verdade, ele vem da realeza. É de uma cultura e de uma origem 
diferentes e não namorou 

— Mas, Kelsey, nós dois também somos de culturas e origens 
diferentes, e isso não a incomoda. A família dele não gosta de você? 

— Não é isso. Os pais dele já morreram. O irmão gosta de 
mim. — Retorci as mãos no colo. — Acho que tudo se resume ao fato 
de eu pensar que ele vai acordar e descobrir que não sou uma 
princesa. Acredito que vai ficar decepcionado se me escolher. É só 
uma questão de tempo antes de perceber isso e me trocar por outra, 
por alguém melhor 

Li voltou-se para mim, incrédulo. 

— Então você está me dizendo que o deixou porque achava 
que ele era bom demais para você? 

— Basicamente, sim. Ele teria ficado preso a mim e vivido 
infeliz. 


— Ele age como se estivesse infeliz perto de você? 

— Não. 

— Kelsey, por mais que me doa dizer isso — começou Li, em 
tom reflexivo, Ren me parece uma pessoa muito cautelosa e 
ponderada. Durante nossa luta, usei cada habilidade e truque sujo à 
minha disposição e ele mal me acertava de volta. Ren estava em clara 
vantagem. A técnica dele está além de qualquer coisa que eu já tenha 
visto. É como se ele tivesse aprendido com todos os mestres antigos. 

E provavelmente aprendeu. 

— Mesmo assim, durante a luta, ele recebia os golpes de forma 
que eu não me machucasse. Isso mostra não só uma habilidade 
incrível, como uma antecipação impressionante. 

Dei de ombros. 

— Eu já sabia que ele lutava bem. 

— Não, você não está me entendendo. Para alcançar uma 
habilidade assim, a lutar dessa forma, é preciso disciplina. Ele poderia 
ter me esmagado, não fez isso. — Li riu com ironia. — Na metade do 
tempo, ele não estava me olhando! Estava observando você, 
preocupado com sua reação. Não estava nem prestando atenção no 
cara seriamente empenhado em matá-lo. 

— O que você está tentando me dizer, Li? 

— Estou tentando dizer que o cara está desesperadamente 
apaixonado por você, isso é óbvio para mim e para todo mundo. Se 
você o ama, precisa dizer isso a ele. Seus temores de ser abandonada 
não combinam com a personalidade dele. Como eu disse, ele é o tipo 
de homem que toma uma decisão e se mantém firme. Não tem nada 
nele que me faça pensar que não seja sincero. 

— Mas. 

Li tomou minhas mãos nas dele e me encarou. 


— Kelsey. Ele só tem olhos para você. 

Baixei o olhar para nossas mãos. 

— E quanto a não ser boa o bastante para ele, é justamente o 
contrário. Ele é que não é bom o suficiente para você. 

— Você está dizendo isso por dizer. 

— Não. Não, não estou. Você é incrível, doce e linda e ele é um 
homem de sorte por ter você. 

— Li, por que está fazendo isso? 

— Porque... eu gosto do cara, para ser sincero. Eu o respeito. E 
porque dá ver que o que você sente por ele é muito mais forte do que 
o que sente por mim. Você é mais feliz com ele. 

— Sou feliz com você também. 

— Sim, mas não é a mesma coisa. Volte para ele, Kelsey. Está 
óbvio que você o ama. Diga isso a ele. Dê-lhe uma chance. — Ele riu 
baixinho. — Mas não se esqueça de dizer que fui superior ao abrir 
caminho. — Ele se inclinou e me envolveu num abraço apertado. — 
Vou sentir saudade, Kelsey. 

Foi como se alguma coisa em mim desse um dique e minha 
perspectiva de repente mudasse. Estava na hora de dispensar Li. Não 
era justo continuar a submetê-lo a essa situação. Meu coração nunca 
seria dele; bem no fundo,fazia algum tempo que eu sabia disso. Eu 
vinha usando-o como uma muleta emocional. Meu relacionamento 
com ele havia se tornado uma desculpa para que eu pudesse adiar o 
momento de encarar Ren. Ficando ou não com Ren, eu sabia que esse 
tinha que ser o fim para mim e Li. 

Emocionada, retribuí o abraço. 

— Vou sentir saudade também. Você foi muito legal comigo. 
Nunca vou me esquecer disso. Agradeça aos rapazes por me 
ensinarem a jogar. 


— Claro. Vamos. — Ele se pôs de pé e me ajudou a levantar, 
me dando um beijo na bochecha. Vou levá-la para casa. E, Kelsey... 
diga a Ren que, se um dia ele a deixar, eu vou atrás dele. 

Eu ri, desolada. 

— Desculpe por ter feito você passar por isso, Li. 

Ele deu de ombros. 

— Por você, valeu a pena. Acho que, se eu a houvesse 
pressionado quando ele apareceu, você o teria escolhido de qualquer 
forma. Pelo menos assim aproveitei sua companhia por mais um 
tempo. 

— Não foi justo com você. 

— Não dizem que no amor e na guerra vale tudo? Isso foi um 
pouco de amor misturado a um pouco de guerra. Eu não teria perdido 
por nada. 

Tomei sua mão nas minhas e a apertei. 

— Um dia você vai fazer uma mulher muito feliz, Li. E espero 
que esse dia chegue logo. 

— Bem, se por acaso você tiver uma irmã gêmea por aí, vou 
querer conhecê-la. 

Eu ri, mas estava com vontade de chorar. 

Li me levou até em casa. Fomos ambos em silêncio. Eu refletia 
sobre o que ele tinha falado. Estava certo. Ren era uma pessoa 
cautelosa e ponderada. Ele tivera séculos para pensar no que queria. 
Por alguma razão, ele me queria. No fundo eu sabia que me amava e 
que nunca me abandonaria. Também sabia que, se eu tivesse 
escolhido outro, Ren estaria sempre por perto para cuidar de mim se 
eu precisasse dele. 


Meus sentimentos por ele nunca estiveram em questão. Li 
tinha razão. Eu devia dizer isso a Ren. Dizer que tinha tomado minha 
decisão. 

Eu vinha tentando seduzir o homem havia várias semanas e 
agora que eu ia finalmente ter o que queria, estava nervosa. Minha 
determinação vacilava. De repente me senti vulnerável, frágil. Meus 
pensamentos eram incoerentes. O que eu deveria dizer? 

Quando o carro parou, Li me encorajou mais uma vez. 

— Diga a ele, Kelsey. 

Ele me abraçou rapidamente e se foi. 

Fiquei parada diante da porta de Ren durante vários minutos, 
pensando que iria dizer. 

A porta se abriu e Ren saiu, parando ao meu lado. Seus pés 
estavam descalços e ele ainda usava a camiseta e a calça branca do 
wushu. Ele me dirigiu um olhar cheio de ansiedade e suspirou, infeliz. 

— Me dizer o quê, Kells? 

Num tom formal, perguntei: 

— Você ouviu, né? 

— Ouvi. 

Seu rosto estava tenso, cauteloso. De repente percebi que ele 
achava que eu ia escolher Li. 

Ele correu a mão pelos cabelos. 

— O que você quer me dizer? 

— Quero lhe contar que já fiz minha escolha. 

— Foi o que imaginei. 


Dei um passo à frente e passei os braços por seu pescoço, mas 
ele permaneceu rígido. Fiquei na ponta dos pés para me aproximar de 
seu rosto. Ele suspirou, me abraçou e me suspendeu. Aconchegou 
meu corpo de encontro ao seu peito sólido como pedra, enquanto 
meus pés pairavam vários centímetros acima do chão. Falei 
suavemente em seu ouvido: 

— Eu escolho você. 

Ele se imobilizou... então afastou a cabeça para olhar meu 
rosto. 

— Então... Li. 

— Está fora da jogada. 

Ele me lançou um sorriso radiante que iluminou a noite 
escura. 

— Então nós.. 

— Podemos ficar juntos. 

Puxei sua cabeça para mim e o beijei suavemente. Surpreso, ele 
se separou de mim para estudar meu rosto e então me apertou ainda 
mais e me beijou de volta. Seu beijo não era suave nem doce. Era 
ávido, quente, ardente. 

Existem muitos tipos de beijos. Há o beijo apaixonado de 
adeus — como o que Rhett deu em Scarlett ao partir para a guerra. O 
beijo de “não posso ficar você, mas quero ficar” — como o de Super-
Homem e Lois Lane. Tem o primeiro beijo — delicado e hesitante, 
cálido e vulnerável. E tem também o de posse — que era como Ren 
me beijava naquele momento. 

Ia além da paixão, além do desejo. Seu beijo era cheio de ânsia, 
necessidade e amor, como todos os outros beijos. Mas também era 
cheio de promessas e juras, algumas doces e ternas, outras perigosas e 


excitantes. Ren estava tomando posse de mim. Reivindicando o que 
era seu. 

Ele me agarrou audacioso como um tigre que captura sua 
presa. Não havia como escapar. E eu não queria escapar. Eu teria 
morrido feliz em suas garras. Eu era dele e ele se certificou de que eu 
soubesse disso. Meu coração explodia com a floração de mil lindos 
lírios-tigres. E eu soube, com uma certeza maior do que qualquer 
coisa que já havia sentido, que nosso lugar era um ao lado do outro. 

Ele finalmente ergueu a cabeça e murmurou de encontro aos 
meus lábios: 

— Até que enfim. 

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